domingo, 24 de setembro de 2017

Uma lua antes

BODERLINE

Na sexta-feira, 22 de setembro de 2017, tinha programado assistir Manchester à Beira-Mar, que teve várias indicações ao oscar e tido por muitos, referência da tristeza. Porém, findei indo ao TCP assistir o monólogo BODERLINE  de Junior Dalberto, desta vez não com José Neto, e, sim, com Bruce Brandão, tido no mundo das coxias como um Global.

Ao chegar, desperto para a música de Tom Zé que fazia companhia a plateia desbundada antes do espetáculo. Plateia desbundada !!, ou quase “né”,  pois o desbunde desapareceu há muito e quase não chegou por aqui, só que quase é apenas um detalhe.

Como outsider genuíno, passo a impressão de que sempre estou triste, mesmo me sentindo bem no cenário  Wunderground.  Apesar de muitos amigos,  nenhuma patota, sempre olho de dentro para fora e mesmo quando me encaixo em algum lugar, no fundo me sinto só, pois sempre o meu todo fica a margem, como se nenhum mundo fosse propriamente meu.

Igualmente a VENTRE DE OSTRA, a interação com o monólogo foi imediata e destaco o momento em que o personagem insiste em não ser INCLUÍDO,  preferindo o meio fio.. a margem da vida.. ou quem sabe,  além dela e continuar inserido no mundo só dele como os personagem dos filmes de Hecto Babenco, Lúcio Flávio o passageiro da agonia, Pixote e Carandiru.

No decorrer do espetáculo, tentei memorizar a belíssima música de Tom Zé Brigitte Bardot, do trabalho TODOS OS OLHOS, de 1973, é de longe, lá de traz,  mas  se chegou até aqui é que tem certa qualidade, só que restrita ao Wunderground dos malditos, como toda a sua obra.

Findei assistindo Manchester à Beira-Mar uma lua depois, com uma xícara de café, uma fatia bolo e o Valor Econômico ao alcance das mãos, as companhias de sempre.

sábado, 9 de setembro de 2017

De passagem



SÓ ANDO SOZINHO

Eu poderia gastar um longo tempo descrevendo todos os sentimentos bons que vieram ao espírito quando falei para poucos, de uma fábula de Schopenhauer sobre  porcos espinhos que perambulavam em um dia frio de inverno.

Para não congelar, os animais chegavam mais perto uns dos outros, porém no momento em que ficavam suficientemente próximos para se aquecerem começavam a se espetar com os próprios espinhos. Para fazer cessar a dor, dispersavam-se e perdiam o benefício do convívio próximo e recomeçavam a tremer de frio e o ciclo se repetia, numa infindável luta para descobrirem uma distância confortável entre o frio do afastamento e a dor da união. Se a fábula fosse sobre pessoas, seria a busca de uma distância entre o envolvimento doloroso e o isolamento sem amor.

No início do isolamento, ainda com a alma enriquecida pelos reflexos da companhia e da amizade perdida, pedi a natureza que não me privasse da graça de algumas lembranças que era e é a única forma de ter algo importante, em qualquer circunstância, onde estiver, por perto.

Se as lembranças pudessem ver o brilho dos meus olhos e sentir a emoção em meu coração não teria nenhuma dúvida da felicidade imensa que tive enquanto escrevia estas poucas palavras.

Aliás !! Escrever, sem saber, é o que me resta, é quando consigo sair um pouco da condição de antiprotagonista, de figura do insucesso, da improdutividade e do apagamento em si.

No resto do tempo, não passo de um escritor que não escreve. Do músico que não compõe. Anônimo e ambicioso. Ingênuo e lúcido. Frustrado e realizado na insignificância, tanto que quando me aproximo de algo sinto dor igual aos porcos da fábula.